domingo, janeiro 20, 2008

Eu preciso dizer que te amo


Algumas coisas são intraduzíveis. Têm razão os italianos quando usam o trocadilho “tradutore-traditore”, fazendo alusão ao caráter instransponível de algumas semânticas, e a dificuldade em ser fiel ao sentido primeiro de algumas palavras e expressões. O papel do tradutor é ser o mais fiel possível ao que está traduzindo: buscar o sentido mais profundo, o mais transparente, o mais verdadeiro, o mais preciso. O tradutor leva em suas mãos a responsabilidade de não derramar uma única gota do copo de água da tradução. Mas sabe-se que a tradução não é um exercício linear; não troco seis por meia dúzia; não substituo semânticas. O que se traduz leva em si a força de contextos, interlocutores, temporalidade, sentimentos.


Falo de sentimentos por uma razão simples: quando estamos expressando emoções humanas intensas é difícil fazê-lo numa língua estrangeira. Quando se fala de amor, raiva, tristeza, alegria, euforia, desespero, medo, etc, a língua usada, quase sempre, é a materna. Em momentos de emoção intensa volta-se ao lugar primitivo dos primeiros afetos, e o que se ouve é o idioma que ensinou a dizer aqueles sentimentos. Eu esqueço a língua do outro, eu me refugio no calor das palavras que me ensinaram a sentir...


Lembro de uma cena da série Prison Break, na qual o personagem de Amaury Nolasco fica furioso com algo e solta um sonoro “¡coño!”. Num momento de fúria ele não poderia dizer son of a bitch!, ou motherfucking!, ou hell!... um porto-riquenho teria que usar a língua espanhola para falar de sua raiva...


Quando eu quero dizer eu te amo, sinto-me demasiado estrangeira se digo te quiero; há nessa frase um sentido inalcançável, eu não tenho certeza absoluta se o meu sentimento será perfeitamente compreendido pois a língua espanhola não é a minha língua materna. Por mais que eu conheça a língua espanhola, eu nunca estarei segura de falar de amor em uma língua estrangeira. Eu preciso te amar com a língua portuguesa, com todos os fonemas, léxico e sintaxes para poder acreditar no meu amor.


Tinha razão Drummond quando pedia “quero me digas de cinco em cinco minutos(...) todos os dias da minha vida(...) eu te amo...”. Nesse pedido havia a urgência temporal do amante, mas também havia a substância que se tornava fumaça ao ser dita, a frase que não tem corpo e quer ser ouvida do ser amado sempre que possível. É como se ao ouvi-la em uma língua estrangeira ela se tornasse mais inalcançável, mais fugidia...


Eu preciso dizer que te amo; com as palavras que posso sentir minhas, e ouvir de você o mesmo, na minha língua, para chegar mais perto da certeza do que cabe em cada letra dessa frase.

Um comentário:

Sera Sánchez disse...

Estoy de acuerdo Fabiana, aunque a veces, cuando aprendes un nuevo idioma, comienzas a pensar indistintamente en uno u otro. Por ejemplo, mi lengua materna es el castellano, pero muchas veces pienso y hablo en catalán. Porque son dos lenguas que domino.

Un abrazo.
Felicidade por tu blog