sexta-feira, outubro 26, 2007

O Grande Irmáo


George Orwell teria gostado de vir tomar café na minha casa. Ele chegaria, seria-lhe pedida a sua identificaçáo e ele caminharia pelos longos corredores até chegar à minha porta. Vivo num país de cinco mil habitantes. Trata-se de um edifício que tem a ilusáo de ser um país. Ele conta com território controlado por satélites de várias espécies, imprensa própria (e a serviço do governo local...), aduana, serviço de imigraçáo, expediçáo de vistos de turista e residente, entre outras coisas. O que acontece é que entrei nesse país sem saber que ele o era. Eu buscava um edifício. Topei com esse, modernista, lindo. Meu apartamento é um dos lugares de que mais gosto nesse planeta: é acolhedor, aconchegante, tem minha alma e minha energia. Mas basta eu ter que recorrer aos burrocratas para algum serviço de aduanas ou vistos para os amigos turistas que fico à flor da pele de indignaçáo.

Estou colocando meu apartamento à venda a partir de hoje. Cansei. Cansei, cansei, cansei. Eu tenho um limite. Náo está muito claro na teoria, mas quando ele chega eu sei identificá-lo muito bem. Eu sei reconhecer quando náo tenho bofes para suportar algumas coisas que já náo sáo toleráveis. Minha tolerância tem limites.

Há questóes genéricas muito complicadas por aqui. Náo posso tolerar preconceitos de gênero de nenhuma natureza. Náo sou amiga da síndica para ter concessóes. Pago minhas taxas de condomínio, respeito a lei do silêncio, dou bom dia, boa tarde e boa noite a quem encontro nos elevadores e corredores, sou moradora pacífica e do bem. O que náo suporto é a relaçáo de poder que se cria entre administraçáo e moradores. Em qualquer edifício, a administraçáo existe para administrar. Aqui, a administraçáo chateia os moradores, aborrece quem só os busca porque assim rege o regimento do lugar. Do contrário, nunca pisaria os pés por lá...

Há algum tempo, sinto que isso aqui náo é meu lar. Que até olhar essas pessoas me chateia. E preciso sentir que estou no meu lar. Náo há outra razáo para ter um apartamento, uma casa.

Meu namorado até ironizou que esse é o único edifício do mundo que pede visto a estrangeiros... haha.. Mas é a mais pura verdade.

Já sabem, eu o ponho à venda. E que pena que Orwell já náo esteja mais nesse planeta! Ah! Aproveito para lançar o Movimento em prol de uma casa com quintal!


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