
Hoje vi um olhar desejante de uma manga. O cenário desse ato ambienta-se no encontro da avenida Augusto de Lima com a Rua Ouro Preto, esquina onde ficam umas barracas de bijuterias e outra, de frutas. E o que eu vi foi um casal de jovens, ambos desses que são chamados pejorativamente de "pivetes", na verdade, dois pardais desejantes, concentrados na imagem da manga rosa, madura e suculenta sobre a banca de frutas.
Por segundos observei que encaravam as mangas, confabulavam entre si e voltavam a olhá-las, como se um dissesse ao outro "deixa, que um dia eu ainda vou poder te comprar uma manga dessas...", como um namorado que promete um diamante, como uma namorada que quer dar um pedaço do mundo ao amado.
Esperei o assalto à banca, mas o casal me decepcionou. Talvez o amor os impeça de agirem como animais que roubam outros animais. Talvez o amor nos dote de algum pudor frente ao ser amado. Pensei que ele daria a manga a ela como troféu de amor, esses romantismos. A menina devia ter uns dezesseis anos, e estava grávida. Não pude deixar de notar a barriga redonda. Devia ser o primeiro filho deles, provavelmente ela estava possuída por um dos desejos que acometem as grávidas.
Pode parecer tão banal pensar que na minha geladeira uma manga extremamente madura me espera, em sua futura condição putrefata porque não tive tempo de parar e comê-la, e isso é algo tão comum para mim, na minha vida pequeno-burguesa: nunca desejei uma manga sem poder comprá-la naquele ou num momento posterior. Por isso senti vergonha do desejo que tomava o coração daqueles dois. Senti vergonha do fato de que a manga vai ao lixo hoje mesmo. Senti vergonha do mundo. Inevitável não pensar nas mangas da minha infância, tão maduras e doces, presentes do quintal de Dona Ceres, vizinha da minha avó materna.
Fabiana Brandão Silva Amorim 09.02.2003.
Um comentário:
Eiii Fabiana...Muito legal seu blogger.
Agora foi só ler essa crônica e m deu uma fome...rsssss
Um abraço e um bjooooooooooo
Gleison(Léo
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